'Máquina do tempo' na Amazônia: g1 entrou em megaestrutura criada por cientistas para simular clima de 2060

  • 08/11/2025
(Foto: Reprodução)
O g1 entrou na 'máquina do tempo' criada por cientistas na Amazônia O g1 entrou no AmazonFACE, a “máquina do tempo” construída por cientistas brasileiros no coração da Amazônia. O experimento busca prever como a floresta irá reagir ao clima de 2060. A cerca de 100 km de Manaus, a megaestrutura conta com 96 torres — maiores que a copa das árvores — para lançar gás carbônico (CO₂) com concentração 50% maior que a atual na vegetação, simulando o previsto para as próximas décadas. Nossa reportagem foi uma das primeiras do Brasil a entrar no experimento pronto. Dentro de uma gaiola, fomos içados a 35 metros de altura até o topo de uma das estruturas metálicas para mostrar como funcionará o sistema de aceleração de emissão de CO₂ naquela área e a interação entre a megaestrutura e a maior floresta tropical do mundo. 🔎 O AmazonFACE: FACE é acrônimo para free air CO₂ enrichment, em inglês, ou enriquecimento de CO₂ ao ar livre CO₂ é liberado por 96 torres que formam seis anéis de 30 metros de diâmetro Cada torre tem 35 metros de altura Seis tanques de armazenamento de gás carbônico de 25 toneladas O sistema de tubulação lança CO₂ em cerca de 300 árvores através de sensores Tudo isso para simular, em uma área de 4,2 mil m² de floresta (ou 16 quadras de tênis), a reação da Amazônia ao clima do futuro Previsto para começar a operar em 2026 📺 O conteúdo também será exibido na série “Amazônia - mãe da ciência”, que estreia dia 10 de novembro na EPTV, mesmo dia em que começa a COP30. Com cinco episódios, a série conta com uma entrevista da ministra Marina Silva e quem dá voz à floresta é a cantora Fafá de Belém. ✅ Clique aqui para seguir o canal do g1 Campinas no WhatsApp Nesta reportagem, você vai ver: A expedição Objetivos do experimento a céu aberto Como as torres estão dispostas na floresta Como o CO₂ é transportado até o experimento O que a pesquisa deve descobrir sobre o futuro do clima Como os resultados alimentam os algoritmos Por que o experimento é destaque na COP30 ✈️A expedição Repórter Heitor Moreira e cinegrafista Jefferson Souza entrevistaram mais de 10 especialistas Reprodução/EPTV Voamos de Campinas à capital do Amazonas e, por mais de duas horas, percorremos sinuosas estradas de terra, em meio a árvores gigantes e inúmeros cantos de pássaros, até avistarmos torres de 35 metros de altura. Ao todo, são 96 torres. Por três dias e duas noites, estivemos ao lado de pesquisadores da Unicamp e do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), que conduzem o experimento a céu aberto, dormindo sob a noite estrelada da floresta e acordando com uma névoa úmida. As perguntas que desejávamos responder eram muitas: o experimento pode impactar o restante da floresta? Não valeria mais gastar R$ 260 milhões com reflorestamento? Vale a pena afetar uma pequena área da Amazônia para ter respostas pelo futuro? "Vale", a resposta é unânime entre todos os pesquisadores, que desde 2011 fazem estudos que atestam a importância da implementação do projeto. O motivo é nobre: o experimento também pode ajudar a entender, no presente, como a floresta irá reagir no futuro, podendo descobrir como preservar as florestas tropicais contra os efeitos negativos das mudanças climáticas e até nortear a formulação de políticas públicas. ➡️Para saber mais sobre os impactos do aumento do gás carbônico, leia: O que o aumento de gás carbônico na Amazônia significa para populações da região e do mundo Infográfico: 'Máquina do tempo' mede efeito do CO₂ na Amazônia Arte/g1 🎯Objetivos do experimento a céu aberto Imagem áerea do experimento AmazonFACE em meio à Amazônia Jefferson Souza Um dos maiores experimentos de mudanças climáticos a céu aberto do mundo é conduzido por pesquisadores da Unicamp, do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa) e do governo britânico. “A gente quer tentar entender como esse aumento de CO₂ na atmosfera afeta o funcionamento da floresta amazônica. Aqui é o lugar de testar experimentalmente o que vai acontecer no futuro”, explica Carlos Alberto Quesada, um dos coordenadores científicos do AmazonFACE. 🎯O objetivo é avaliar como a floresta vai reagir ao aumento de 50% na concentração de dióxido de carbono (CO₂) na atmosfera esperado para os próximos 35 anos. Para isso, durante uma década, os pesquisadores vão aumentar artificialmente a concentração de CO₂ em uma área delimitada. Uma das perguntas feitas pelos pesquisadores é: como o aumento de CO₂ atmosférico afetará a resiliência da floresta Amazônica, da biodiversidade que ela abriga e dos serviços do ecossistema que ela provê? ➡️ Para tentar responder, uma equipe multidisciplinar definiu que seis componentes serão analisados: os fluxos e armazenamento de carbono; a ciclagem dos nutrientes; o fluxo de umidade da floresta para a atmosfera; a resposta de animais e plantas; os impactos para as populações da região Amazônica e do mundo; e modelos computacionais para formulação de hipóteses e projeções. Para saber mais sobre as seis linhas de pesquisa avaliadas pelos pesquisadores, leia: Entenda as 6 linhas de investigação do estudo que usa 'máquina do tempo' para desvendar futuro da Amazônia 🗼Como as torres foram dispostas na floresta Torre de alumínio de 35 metros e altura integra projeto AmazonFACE na Amazônia Jefferson Souza Ao pé das torres, é preciso inclinar bastante a cabeça para tentar enxergar o fim da estrutura de alumínio. Com capacete e outros equipamentos de segurança fica ainda mais difícil. Mas para ficar perto do experimento, é assim que tem que ser. As 96 torres de alumínio foram instaladas na floresta com "o mínimo impacto possível", explica David Lapola, coordenador científico do AmazonFACE pela Unicamp. Divididas em 6 círculos de 30 metros de diâmetro, com 16 torres cada, as estruturas metálicas possuem tubulações que lançam gás cabônico nas cerca de 50 árvores que ficam dentro de cada anel — veja o infográfico abaixo. Em três dos aneis, o gás carbônico liberado é enriquecido; Nos outros três aneis, o gás é lançado sem enriquecimento, apenas para controle. A vista de cima, no entanto, é outra história: a imensidão verde da copa das árvores contrasta com os pontos brancos das outras torres do projeto. ⬆️De dentro da gaiola Carlos Alberto Quesada, coordenador científico do AmazonFACE pelo Inpa, acompanha a reportagem em uma gaiola iaçada a 35 metros de altura Jefferson Souza Para subir até lá, é preciso deixar o nervosismo de lado e entrar em uma gaiola metálica içada por um imenso guindaste, controlado pelo gerente operacional Bruno Takeshi com um controle de mão que lembra um joystick. — Atenção, Bruno! Girar mais 30 metros — pediu Quesada pelo rádio. Dito e feito. Quesada já acostumado às subidas pelo guindaste, acompanhou nossa equipe até o topo de um dos aneis. — Balança muito? — perguntou o repórter. — Um pouco. Isso aqui é como um parque de diversões. A diferença é que é o único que existe na Amazônia — respondeu Quesada, empolgado. Um dos criadores da “máquina do tempo”, Quesada informa que o experimento é um dos maiores do mundo em termo de medir as mudanças climáticas a céu aberto. Ele também tranquiliza o repórter que questiona se a dispersão do gás carbônico irá prejudicar a floresta. Segundo os pesquisadores, uma área muito pequena da floresta Amazônica é usada no experimento, dentro de um ambiente controlado e sem prejuízos potenciais para fauna e flora. São cerca de 300 árvores, em uma área correspondente a 4,2 mil m², o mesmo que 16 quadras de tênis. Já as respostas que o estudo pode gerar são muito recompensadoras e podem influenciar como o mundo lida com as mudanças climáticas no presente. AmazonFACE, experimento, gás carbônico, Amazônia, Manaus Maria Clara Ferreira Guimarães/AmazonFACE 🚛Como o CO₂ é transportado até o experimento O gás carbônico que abastece as torres não chega gasoso na floresta, mas, sim, na forma líquida, por meio de caminhões. E para isso existe uma operação logística e tecnológica complexa, coordenada por Bruno Takeshi, gerente operacional. Na base do experimento, a 200 metros das torres, ficam seis tanques com capacidade para 25 toneladas cada, que armazenam um total de 150 toneladas de dióxido de carbono. “Esse gás passa por um vaporizador atmosférico, se transforma em gás e é liberado nas áreas de pesquisa por meio de tubulações controladas por sensores. O coração do sistema é o container de controle, que coordena tudo”, conta Takeshi. Dentro do container que fica ao lado das torres, em meio à floresta, a engenheira Maria Juliana Monte, do Inpa, monitora os dados. Tanque armazena até 25 toneladas gás carbônico líquido Jefferson Souza 🌿O que a pesquisa deve descobrir sobre o futuro do clima Previsto para começar em 2026, o estudo deve durar pelo menos dez anos. Mas já nos primeiros dias os cientistas terão resultados sobre a taxa de fotossíntese de algumas espécies, por exemplo. Já o processo de crescimento do tronco de uma árvore é mais lento e precisa de mais tempo para ser compreendido no novo cenário. Como o aumento do CO₂ não afeta todas as árvores da mesma forma, a pesquisadora Izabela Aleixo, do Inpa, estuda como as espécies vão responder ao novo cenário. “A minha parte é entender a resposta de diferentes espécies — quais crescem mais, armazenam mais carbono ou produzem mais frutos”, explica Aleixo. 🔎Vale lembrar que a Amazônia impacta muito além da região Norte. Segundo Quesada, entre 30% e 50% das chuvas que atingem o sul do Brasil têm origem ali na floresta. São as árvores que produzem essa umidade, liberando vapor d’água que sobe para a atmosfera e forma nuvens. As massas de ar úmido percorrem longas distâncias pelo continente, em um fenômeno conhecido como rios voadores. É essa água que mantém o equilíbrio do clima, abastece a agricultura, garante a produção de alimentos e sustenta a geração de energia em todo o país. Pesquisadora mete fotossíntese de plantas na Amazônia INPA/Unicamp Leia também: Cientistas constroem 'máquina do tempo' para entender efeitos de mudanças climáticas na Amazônia O que o aumento de gás carbônico na Amazônia significa para populações da região e do mundo 📊Resultados que alimentam algoritmos A partir do aumento de gás carbônico na atmosfera, os modelos atuais tendem a projetar um efeito de estimulação de produtividade de plantas, que neutralizaria os efeitos das temperaturas mais quentes e condições mais secas na floresta. No entanto, observações a longo prazo identificaram que o sumidouro de carbono da Amazônia está se enfraquecendo. A resposta das florestas tropicais às mudanças climáticas de longo prazo segue incerta. Se variamos os cenários modelados, é possível prever até mesmo um "ponto de não-retorno da floresta amazônica", em que áreas substanciais de floresta tropicais poderiam ser substituídas por florestas sazonais ou savanas. Um artigo publicado pela equipe AmazonFACE em 2018 estimou que, caso a floresta entre em colapso ou atinja o ponto de inflexão, o dano socioambiental ao longo de um período de 30 anos após esse momento crítico pode ficar entre U$ 957 bilhões e U$ 3,5 trilhões. Será mesmo possível que uma floresta maior que a União Europeira e capaz de abrigar 16 Franças dentro de si um dia deixará de existir? O diagnótisco atual de Quesada não é muito acalentador: "A floresta está na UTI". Reduzir essa incerteza é um ponto essencial crítico para conduzir o desenvolvimento futuro de políticas para a região Amazônica, bem como para as análises globais de vulnerabilidade do ecossistema às mudanças climáticas. E para tentar prever os impactos das mudanças climáticas no globo e ampliar os resultados do experimento, os cientistas trabalham com modelagem climática. “O estudo é localizado e vai durar dez anos. Para um ecossistema, isso é muito pouco. Por isso usamos modelos para extrapolar os resultados para toda a bacia amazônica e outras florestas tropicais”, explica David Lapola, coordenador científico do projeto pela Unicamp. Esses modelos ecossistêmicos, como são chamados os algoritmos que preveem a interação entre os organismos e o meio ambiente, ajudam a definir o que medir em campo e a aumentar a precisão das projeções. Pequisadora Maria Juliana Monte monitora os dados na cabine de controle Jefferson Souza 🌟Por que experimento é destaque na COP30 O AmazonFACE já chama atenção internacional e será um dos destaques da COP30, que acontece a partir de 10 de novembro, em Belém (PA). Em 2014, o AmazonFACE se tornou um programa oficial do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), com coordenação da Unicamp e do Inpa. Foram investidos até agora R$ 122 milhões, sendo R$ 68 milhões do governo do Reino Unido, que também é parceiro no programa, e R$ 54 milhões do Brasil. O custo total, incluindo a compra de CO₂, é de R$ 260 milhões. O experimento reúne aproximadamente 130 pessoas, incluindo pesquisadores, estudantes e cientistas sociais de cerca de 40 instituições. Os primeiros testes começaram neste ano, e o funcionamento completo está previsto para o início de 2026. Segundo o coordenador da delegação da Unicamp na COP30, Roberto Donato, trata-se de um projeto estratégico “que mostra a capacidade do Brasil de contribuir significativamente para as discussões do núcleo da discussão climática”. Para os cientistas, entender como a Amazônia reage ao clima do futuro é também uma forma de proteger o presente — e garantir que os “rios voadores” continuem levando chuva, vida e equilíbrio para todo o país. Série "Amazônia - Mãe da Ciência" mostra como a floresta inspira descobertas científicas VÍDEOS: tudo sobre Campinas e região Veja mais notícias sobre a região no g1 Campinas

FONTE: https://g1.globo.com/sp/campinas-regiao/noticia/2025/11/08/maquina-do-tempo-na-amazonia-g1-entrou-em-megaestrutura-criada-por-cientistas-para-simular-clima-de-2060.ghtml


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